Tomás Vaz de Borba (1867–1950)
Figura maior da vida musical portuguesa na viragem do século XIX para o século XX, Tomás Vaz de Borba nasceu em Angra do Heroísmo, nos Açores, em 1867. Depois dos estudos iniciais no Seminário de Angra e na escola de canto da Sé Catedral, partiu para Lisboa em 1891 para frequentar o Conservatório, onde concluiu brilhantemente os cursos de Piano e de Composição. Sacerdote, músico e pedagogo de exceção, Borba foi um incansável dinamizador da vida cultural, deixando uma marca indelével como professor no Conservatório de Música de Lisboa, no Liceu D. Maria Pia e na Academia dos Amadores de Música, onde desempenhou também funções de diretor artístico.
Respeitado como artista e como sacerdote, Borba conjugou a profunda ligação às raízes açorianas com uma visão cosmopolita e humanista da cultura musical. Para além da sua vasta produção de música sacra, canções de inspiração popular e composições corais e instrumentais, distinguiu-se como um inovador no domínio da pedagogia musical, incentivando a criação de repertório próprio para as escolas e para a formação de um público musical mais alargado.
A atribuição do seu nome à Escola Básica e Secundária Tomás de Borba, onde está integrado o Conservatório Regional de Angra do Heroísmo, na sua cidade natal, representa um reconhecimento perene dos Açores ao seu valioso contributo para o enriquecimento da cultura musical portuguesa. Segundo António Duarte, Tomás Borba “teve uma notável influência na vida musical portuguesa, na exigência do profissionalismo, na formação de muitas dezenas de músicos entre os quais se podem destacar Luís e Pedro de Freitas Branco, Rui Coelho, Fernando Lopes-Graça, António Fragoso, Ivo Cruz, etc.” (Duarte, 2008, p. 13).
A Obra para Violino e Piano
No âmbito da música de câmara, Tomás Borba dedicou especial atenção à composição para violino e piano, concentrando nesta formação instrumental algumas das suas obras mais significativas. A produção de Borba neste domínio inclui:
- uma Sonata em Ré Maior, em quatro andamentos;
- uma Suite Portuguesa, em cinco andamentos (e
mais quatro possíveis andamentos);
- duas Peças sem título, uma em Dó Maior e outra em
Ré menor.
Tomás Borba terá terminado o seu curso de piano no Conservatório em 1894 e o Superior de Composição em 1895, com 28 anos de idade, “submetendo, para o exame final deste último, uma Sonata para Violino e Piano” (Rosa, 2010, p. 17). Sobre a sonata enquanto forma musical, num dos seus manuscritos "Melodia, Ritmo e Formas", Tomás Borba afirma:
A mais estética de todas as formas musicais, que a arte divina dos sons trouxe a independência e a graça sublime que do céu veio para ao céu nos conduzir, é a sonata, a última palavra da ordem e da euritmia. A sonata, no seu tipo artístico, compõe-se de quatro tempos ou andamentos, cada um dos quais tem seu compasso e movimento próprios, entre os quais, todavia, se não dispensa o nexo lógico de unidade tonal e senso artístico. Os quatro andamentos da sonata clássica, a sonata beethoviana por excelência, sucedem-se geralmente seguindo esta ordem: Allegro, Adagio, Scherzo e Finale. Há sonatas com três andamentos somente, com dois e até com um apenas, como a velha toccata monteverdiana. Não podemos, em tão poucas palavras, mencionar todas as variantes que o génio dos artistas tem introduzido na ordem de sucessão dos trechos componentes da sonata. A sonata não é sempre para um só instrumento. Quando escrita para dois, ainda conserva o mesmo nome — sonatas para violino e piano, para violoncelo e piano, etc. — mas toma de trio se é para três instrumentos — tomando, naturalmente, cada um dos seus andamentos maior importância e desenvolvimento — quarteto para quatro, quinteto, sexteto, septeto ou septuor, octeto, noneto e finalmente, quando para uma orquestra completa, sinfonia (Tomás Borba cit. in Rosa, 2008, pp. 55–56).
A Suite Portuguesa, com registos de interpretação a 18 de março de 1928 na Academia de Amadores de Música, por Maria da Luz Antunes e Cecília Borba, reflete a influência das correntes nacionalistas, tão marcantes nas composições musicais da transição para o século XX. Cada andamento desta suíte — Canção, Melodia Religiosa, Na Romaria. Bourrée, Embalo. Canção do Berço, Sapateia, Embalo, No Arraial e Melodia Antiga— evoca de forma subtil e estilizada danças e melodias tradicionais, testemunhando o cuidado de Borba em dignificar as raízes culturais portuguesas e açorianas, através de uma linguagem depurada e moderna.
As Duas Peças para violino e piano, mais breves e de carácter intimista, evidenciam o domínio do compositor sobre a pequena forma. A peça em Dó Maior caracteriza-se por uma escrita clara e cantabile, enquanto a peça em Ré menor articula exposição, desenvolvimento e reexposição com concisão e elegância, culminando numa breve coda.
Esta projeto contempla a edição inédita e gravação da obra integral para violino e piano de Tomás Vaz de Borba, revelando-nos um compositor atento às formas clássicas, sensível à modernidade do seu tempo e profundamente enraizado no património musical português.
Ana Catarina Pinto
REFERÊNCIAS
Borba, T. & Lopes-Graça, F. (1962). Dicionário de Música. Edições Cosmos.
Duarte, A. (2008). “Partilhar e Viver Universos e Intinerários Excepcionais”. In D. Rosa (ed.), Tomás Borba (pp. 12-15). Escola Básica e Secundária Tomás de Borba.
Nery, R. V. (2008). “Tomás Borba Reencontrado: Um Exemplo Único de Tolerância e Modernidade na Música Portuguesa do Século xx”. In D. Rosa (Ed.), Tomás Borba (pp. 7-11). Escola Básica e Secundária Tomás de Borba.
Pereira, L. (2013). Coro Padre Tomás de Borba, AMIT Contributos Para a sua História. 30 Anos a Encantar. Blu Edições.
Ribeiro, L. (1983). Obras III Vária – Centenário Ribeiriano. Instituto Histórico da Ilha Terceira.
Rosa, D. (2008). Tomás Borba. Escola Básica e Secundária Tomás de Borba.
Rosa, D. (2010). Tomás Borba. Trovador das Gentes Novas. Coleção Retratos.
Rosa, D., d‘Abreu, E., Ávila, A. (2019). Tomás Borba: Composição e Pedagogia. Instituto Açoriano de Cultura │ Instituto Histórico da Ilha Terceira.
Rosa, D. (2014). Tomás Borba na História da Música Portuguesa do século xx – Modernidade e Tolerância. Institituto Açoriano de Cultura e Movimento Patrimonial pela Música Portuguesa.
MEDIA & PRESS
Diário Insular, terça-feira, 15-04-2025
Diário Insular, sábado, 31-05-2025